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Exclusivo: documento da FAB aponta operação diplomática por trás do misterioso avião russo em Brasília

  • Foto do escritor: Outro Lado De Dourados
    Outro Lado De Dourados
  • 25 de ago.
  • 6 min de leitura

(A Investigação)

Cargueiro russo sancionado ficou três dias na Base Aérea de Brasília e, em seguida, seguiu para Bolívia, Colômbia, Venezuela e Cuba; episódio ocorre em meio às tensões entre Estados Unidos e Venezuela.


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Um cargueiro estratégico russo Ilyushin IL-76TD (RA-78765) pousou em Brasília em 10 de agosto e permaneceu até o dia 13, estacionado na Base Aérea de Brasília (BABR). A aeronave é operada pela Aviacon Zitotrans, empresa alvo de sanções dos Estados Unidos desde 2023 por transportar material bélico para a Coreia do Norte e realizar voos de carga para a Venezuela e países da África, em violação a embargos internacionais contra Moscou.

A estadia de três dias foi considerada atípica, já que não houve registro do voo nos sistemas da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) — indício de que se tratava de trânsito de Estado, e não de operação comercial.

“Nossa companhia aérea opera voos fretados de carga”, informou a assessoria de imprensa da empresa ao portal Metrópoles. “No entanto, nosso cliente que reservou o voo solicitou que não divulgássemos nenhuma informação comercial relacionada aos seus negócios”. Ou seja, o cliente da Aviacon Zitotrans pediu anonimato.

Segundo a Constituição (art. 49, II), é da competência exclusiva do Congresso Nacional permitir que forças estrangeiras transitem pelo território nacional ou nele permaneçam temporariamente; sem essa anuência, o trânsito de aeronave de Estado estrangeira pode ser irregular. Já há reação no Parlamento: senadores e deputados apresentaram requerimentos de informação aos ministérios de Relações Exteriores, Defesa e Portos e Aeroportos, cobrando quem autorizou a operação, qual a finalidade, qual a carga e a tripulação e quais protocolos foram observados. Os ministros têm 30 dias para responder.

Enquanto permaneceu na base, apenas a cauda do cargueiro era visível para quem observava do terminal de passageiros do aeroporto Juscelino Kubitschek. Entusiastas da aviação e curiosos se revezaram por dias na tentativa de registrar a aeronave. A cena contrastava com o silêncio oficial: militares da FAB evitavam dar informações sobre carga ou tripulação, limitando-se a dizer que “não podiam comentar”.

Entretanto, o itinerário da nave já dava pistas sobre o caráter estratégico da missão. O avião partiu de Moscou em 7/8, fez escalas em Baku (Azerbaijão), Argel (Argélia) e Conacri (Guiné), e aterrissou em Brasília às 8h12 do dia 10. Três dias depois, 13, decolou às 19h16 rumo à Bolívia. Dali, seguiu para Bogotá (Colômbia), depois Caracas (Venezuela) e terminou em Havana (Cuba). A permanência no Brasil destoou das outras paradas, onde o cargueiro ficava em solo por menos de 24 horas.

Agora, um documento interno da FAB lança nova luz sobre o episódio. Um calendário interno (QTM de agosto) da BABR anotou “DESEMB RÚSSIA — 10/8” e “EMB RÚSSIA — 13/8”. As siglas significam desembarque e embarque do avião, indicando janela de chegada e saída previamente organizada. Segundo fontes ouvidas pela reportagem, esse calendário não está classificado como sigiloso: se encontra disponível na página inicial da intranet da Base Aérea de Brasília, em “caráter ostensivo” para todo o efetivo. Ou seja, não se trata de um vazamento confidencial nem de acesso hacker, mas de um documento de rotina usado para planejamento operacional.


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O QTM é o instrumento de agenda da base e, quando registra EMB/DESEMB, aciona rotinas de coordenação e suporte (reserva de pátio, segurança de área restrita, abastecimento com combustível e hotéis de trânsito). Esse procedimento está amparado pelo Programa de Trabalho Anual (PTA) da BABR, aprovado por portaria do Comando de Preparo em 27 de janeiro de 2025, que integra o planejamento da base ao do COMPREP e distribui responsabilidades internas para a execução das atividades ao longo do ano.

Além disso, a ICA 205-22 (norma do Comando da Aeronáutica) define o trânsito de comitivas/autoridades estrangeiras em organizações militares e prevê coordenação com o EMAER e medidas de controle de acesso e segurança pela própria base. Em suma: EMB/DESEMB não são anotações casuais, mas marcos de um atendimento institucional previamente organizado.

A anotação comprova planejamento de trânsito oficial — não uma escala técnica fortuita. O que se confirma, à luz da documentação, é o atendimento coordenado à aeronave de Estado.

Contexto internacional

Em 19 de agosto, seis dias após a partida do IL-76 do Brasil na direção Caracas–Havana, um C-32B da USAF — jato branco associado a missões especiais — pousou em Porto Alegre e seguiu para Guarulhos; a Polícia Federal informou à CNN Brasil que a aeronave transportava diplomatas para o consulado norte-americano na capital gaúcha, informação repetida por outros veículos.

No mesmo período, os Estados Unidos deslocaram três navios de guerra para o Caribe, próximos à Venezuela, em operação apresentada como contranarcóticos. De acordo com a Reuters e Associated Press, os navios são destróieres com sistemas de combate Aegis: USS Gravely, USS Jason Dunham e USS Sampson. Os três são capazes de levar mísseis que, juntos, teriam poder de fogo maior do que toda a Marinha venezuelana. Segundo as agências, mais de 4.000 militares foram posicionados na região.

Em 2020, o presidente venezuelano Nícolas Maduro foi acusado na Justiça de Nova York de narcoterrorismo e conspiração para importação de cocaína. Esse mês, a procuradora-geral dos Estados Unidos, Pam Bondi, elevou a recompensa para a prisão de Maduro: de 25 para 50 milhões de dólares. Em 12 de agosto, Marco Rubio, secretário de Estado dos EUA, afirmou que o “regime narcoterrorista” de Maduro precisa ser enfrentado “com algo mais que recompensas”.

Em resposta, Nicolás Maduro chamou a pressão americana de “uma ameaça bizarra de um império em declínio” e convocou milhões de soldados de milícias governistas para a “defesa do país”.

Até o momento, não há nexo causal comprovado entre esses fatos e a passagem do cargueiro russo por Brasília. Mas a coincidência temporal é evidente: a chegada de uma aeronave russa sob sanções ocorre enquanto crescem as movimentações militares no entorno da Venezuela. A Rússia é aliada militar de Caracas, com histórico de vendas de armas e cooperação de defesa, e a presença do cargueiro no Brasil pesa ainda mais num cenário marcado pela guerra na Ucrânia. No conjunto, são movimentos que elevam a tensão regional, com o Brasil servindo de ponto de passagem.Para o Brasil, a conta pode sair cara. Neste mês, veio à tona que os Estados Unidos cancelaram, em 23 de julho, uma conferência espacial com a Força Aérea Brasileira prevista para 29 a 31 de julho, acendendo alertas na Defesa sobre afastamento entre os governos — movimento que se segue às sanções de Washington ao ministro Alexandre de Moraes por violações de direitos humanos e restrições à liberdade de expressão.


Avião cargueiro russo Ilyushin IL-76 similar ao que pousou no aeroporto de Brasília. (Foto: Bob Adams/Wikimedia)
Avião cargueiro russo Ilyushin IL-76 similar ao que pousou no aeroporto de Brasília. (Foto: Bob Adams/Wikimedia)

Segundo o portal especializado Aerojota, o episódio atual lembra o caso de 2022, quando um Boeing 747-300 da estatal venezuelana Conviasa foi retido na Argentina devido a sanções do Tesouro dos EUA. Em 2024, situação semelhante ocorreu no Rio de Janeiro: o Ilyushin Il-96 que trouxe o chanceler russo Sergey Lavrov não conseguiu abastecer no Galeão, já que todas as empresas recusaram atendimento; apenas a brasileira Jetfly Combustíveis aceitou, sendo depois punida com restrições nos EUA.

Embora sites especializados em aviação, como o portal AeroIN, tenham identificado a aeronave como o RA-78765, matrícula que integra a lista de sanções do Tesouro americano, a Agência Lupa publicou em 19 de agosto de 2025 uma checagem afirmando que o avião em Brasília estaria registrado como “AZS-1705”. O problema é que essa informação está errada. “AZS-1705” não é matrícula — é apenas o callsign, o número de voo usado momentaneamente. A matrícula do cargueiro é fixa: RA-78765, justamente o avião sancionado. Ao confundir callsign com matrícula, a Lupa acabou criando uma narrativa que tenta diluir a gravidade do episódio.

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O que falta responder

A revelação do QTM não encerra o caso — amplia o campo de perguntas — e é justamente nelas que se concentram as investidas do Congresso. Deputados e senadores destacaram que a Constituição exige autorização do Parlamento para a entrada de meios militares estrangeiros no país e passaram a tratar o caso como potencial violação constitucional e risco à soberania. A cobrança ficou mais intensa porque a aterrissagem ocorreu um dia após o presidente Lula conversar por telefone com Vladimir Putin sobre cooperação no BRICS, e resgata o precedente de 2023, quando navios militares iranianos atracaram no Rio com aval do governo, gerando atritos diplomáticos com Washington.

O senador Márcio Bittar (União-AC) a protocolou requerimentos de informação aos ministros Mauro Vieira (Relações Exteriores) e José Múcio Monteiro (Defesa), cobrando quem autorizou o trânsito do IL-76, com que finalidade, qual a carga e a tripulação e quais protocolos foram seguidos diante das sanções dos EUA à Aviacon Zitotrans. Bittar também apontou possíveis vínculos do cargueiro com transporte de material bélico e apoio logístico à Venezuela.

Na Câmara, o deputado General Girão (PL-RN) sustentou que a entrada de meio militar estrangeiro sem anuência do Parlamento fere a Constituição, que reserva ao Congresso a autorização para trânsito e permanência de forças estrangeiras; para ele, o caso afronta a soberania do país.

O deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) apresentou o REQ 342/2025 na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle (CFFC), dirigido ao Ministério de Portos e Aeroportos, pedindo à Anac dados sobre o pouso de 10 de agosto de 2025, destacando a ausência de registro comercial e solicitando explicações. A senadora Damares Alves (PP-DF) quer saber se houve desembarque de carga e o conteúdo, mencionando especulações de até 5 toneladas.

Esses requerimentos podem destravar a trilha documental que falta para esclarecer o caso: foi apenas trânsito logístico ou apoio a uma ação coordenada? E, do ponto de vista jurídico, houve — ou não — a anuência congressual exigida para a entrada de meio militar estrangeiro. Resta agora que as autoridades expliquem: o que a Rússia veio fazer em Brasília entre os dias 10 e 13 de agosto?


Fonte: "David Agape"

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